Fazendo uma limpeza e organização em meus arquivos antigos encontrei esse texto que escrevi na época da faculdade.Não faz tanto tempo assim e ele me fez relembrar o quanto produzimos nesse período e quanto texto fica esquecido nos trabalhos entregues.
Nesse processo de limpeza fiz uma seleção, muitos foram excluídos e os poucos selecionados irei publicar no Blog. Tem um tema interessante sugerido pela inesquecível professora Marcia Celestini:
"O lugar da memória
e a memória do lugar"
Se até as ruínas são importantes para nos contar a história das civilizações porque deixar desaparecer tesouros arquitetônicos que representam épocas? Cada casa antiga demolida é um pedaço do passado que se vai, talvez nem nos museus encontraremos mais o tijolo utilizado em sua construção. Em São Paulo, assim como em tantas outras cidades do nosso país, prédios e casas antigas desapareceram dando lugar aos estacionamentos, talvez alguns ainda continuem vivos na lembrança de alguns ou em alguma fotografia amarelada.
Lembro-me de um texto que li há um certo tempo atrás que nunca esqueço do Marcelo Rubens Paiva, articulista da Folha, cujo título, “Aquela São Paulo”, descrevia com melancolia a saudade do seu tempo de infância, época em que na cidade muitas árvores embelezavam as ruas como a paineira que existia na Eusébio Matoso e que as crianças brincavam nas praças e calçadas, e, incrível pensar isso hoje, as torcidas se misturavam sem a presença de policiais nos estádios.
Toda cidade tem uma história, precisamos desse resgate cultural em nosso país conscientizando a população da importância dessa memória, não basta apenas saber quem foi o Padre Anchieta, é preciso que o cidadão conheça mais profundamente elementos que estão presentes em seu meio ambiente, como a história de sua rua e seu bairro, o estilo e as pinturas dos monumentos, prédios, casas e igrejas que são figuras marcantes por onde ele circula no seu dia-a-dia.
Fiquei muito contente com a notável divulgação sobre a história de São Paulo veiculada pelos vários meios de comunicação em função do aniversário de 450 anos da cidade, eu mesma fiz descobertas incríveis através de reportagens que foram contando as várias faces dessa efervescente urbe. Creio que essas informações tenham levado vários leitores a conhecer um pouco mais sobre São Paulo. É importante não só lamentar o que se perdeu devido ao descaso com o patrimônio, mas, também conhecer o que ainda resta e fazer parte desse movimento de valorização cultural.
Felizmente, nem tudo são ruínas, algumas cidades brasileiras despertam para o processo de revitalização do patrimônio histórico, é um fio de esperança que começa a clarear as trevas do abandono, exemplo disso é o que acontece em Fortaleza. Num brilhante processo de revitalização foram restauradas praças, igrejas, teatros, ruas, monumentos, edifícios e casarões. A reforma concluída na velha Rua Dragão do Mar é uma excelente amostra de como essa transformação é benéfica, o que antes era um lugar sujo, feio, abandonado, inseguro, hoje revitalizado, conta com badalados bares, restaurantes e o belíssimo centro cultural Dragão do Mar que tem atraído muitos visitantes ao local. Aqui em São Paulo a reforma na Estação da Luz também é uma amostra desse rico processo, quem passa por ali hoje depois dos transtornos das obras se encanta com sua luz que irradia todo o esplendor dessa obra magnífica de arquitetura inglesa.
Nesse processo de preservação do patrimônio é imprescindível a integração das Secretarias de Cultura, Turismo e Educação em projetos que aproximem a população dessa cultura histórica, ensinando não apenas o nome e onde fica o local mas a importância dele na história. Creio que se levarmos os alunos para conhecerem os monumentos, casarões, teatros, igrejas, enfim, a história da sua cidade, que naturalmente começará a se confundir com a sua, eles vão aprender a amá-la e respeitá-la e ver que o progresso crescente pode acontecer sem significar a destruição do passado histórico.
O começo para uma futura geração consciente está na educação do presente, só assim os cidadãos vão crescer também responsáveis pelo seu lugar. E quem sabe, essa geração vindoura não permita o desaparecimento de tesouros arquitetônicos como a Mansão dos Matarazzo na Paulista, um palacete que foi em um passado não muito longínquo uma jóia da arquitetura, hoje é um estacionamento. E nem precisarão escrever textos como o de Walcyr Carrasco, “Esplendor em ruínas”. Ele finaliza seu texto convocando a sociedade paulistana a arregaçar as mangas e lutar pela história da nossa cidade. ”Se o paulistano está realmente interessado em viver em uma cidade mais agradável, é preciso não perder mais tempo e tomar consciência do que ainda pode ser salvo!”
Se glorificarmos só o moderno e não recuperarmos o que já existe entraremos em um processo perigoso de uma cultura sem valor. Hoje o moderno prédio ou memorial está novo, daqui a alguns anos estará necessitando de restauração, será que acontecerá a reforma ou ele cairá no descaso do velho, e condenado ao abandono, acabará por ser demolido?
A história de um povo e sua cultura estão ligadas por laços visíveis às suas cidades, sendo assim, somos reflexos dela e mais do que nunca precisamos analisar se estamos contente com a imagem refletida no espelho.
Milhões de turistas visitam todo o ano o Coliseu em Roma, um gigante do passado vivo no presente. Roma é um canteiro de restaurações urbanísticas. A França gasta milhões por ano em restaurações. É fácil deduzir porque França e Itália preservam sua história e cultura, elas reconhecem o grande tesouro existente nelas. Não que o moderno lá não exista, só que ele não significou a destruição do passado, quando isso ocorre, o futuro se torna vazio.
São Paulo tem um grande potencial turístico, é a capital dos eventos culturais, uma pérola histórica do país. Nos ares poluídos dessa cidade ainda resiste uma atmosfera de glamour. As belas cores do renascimento estão prontas a desabrochar pelas mãos graciosas da restauração. Mesmo nas cinzas do abandono, a arte aqui brilha, com pincel, tinta, vontade e dedicação faremos renascer um novo velho passado, nosso retrato no espelho da cultura.
Paulistanos de várias faces que tem nessa cidade um lar, vamos dela tratar, evoluir nossa consciência e lutar pela preservação de nossa história. Vamos apagar esses lapsos de esquecimento e despertar para o lugar da memória e a memória do lugar.
A arte de relacionar-se é um desafio e uma bênção que me permite aprender e ensinar com os personagens que fazem parte dos capítulos de minha história. E ainda há muito para escrever ...para trocar experiências com os irmãos que habitam o cenário de minha existência...afinal... cada amanhacer é uma dádiva...todo crespúsculo é uma passagem...e a noite as sombras nos faz enxergar a luz do ciclo que se completa e se renova dia a dia.
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