quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Notas despedidas

O clima
Meu corpo anda dolorido da avalanche de demandas e cá estou para registrar minhas notas nessa manhã quente da primavera paulista.Começo refletindo sobre como a meteorologia impacta o estado dos sentidos. Na semana úmida de novembro, quando a umidade aflora o cheiro do mofo das coisas, o céu cinza, ausência do sol, despertou memórias do passado, passos com pés molhados pelo furo e rosto quente de lágrimas salgadas. Um contraste da garoa fina e incessante com o rio quente que descia dos olhos, aquecendo a caminhada. Lembrei também da umidade da serra em Ubatuba com as frestas de sol que surgiam de quando em quando e acendiam a esperança do céu azular. Qual o meu clima agora? Agarrando-me a brecha solar que indica que a estrela está viva.

A cirurgia
Na companhia de mãe, nas estações Osasco, Barra Funda e Bresser Mooca, catracas, exames, consultas, cardiologista, cirurgião, pressão baixa e alta no círculo das emoções. Observando seus cachos com a tiara de pano que ela adotou, seu olhar preocupado, sua angústia desse ir e vir, incomum a sua rotina. Começamos mãe, temos que ir avançando nas etapas e finalizar o processo, dizia eu buscando uma coragem que em alguns momentos vacilava também. E chegou o dia da cirurgia. Ainda era madrugada quando saímos de casa para o hospital. Meu coração suspenso ao afagar seu braço quando ela foi com a enfermeira para o centro cirúrgico. As horas intermináveis até eu novamente encontrar com minha mãe no final do dia arrastaram-se doloridas. Ela se recupera bem, em casa, seu canto favorito.

Ser casa
Minhas referências de lar, quando eu realmente me sinto em casa, tem personagens vivos, em carne e osso, e nas recordações que palpitam no meu corpo. A casa dos meus avós paternos sempre tinha gente, filhos, netos, sobrinhos, parentes de diferentes graus e conhecidos. O doce de madrinha, sim ela foi e segue minha madrinha-avó, as merendas que vinha da bodega, seu pirão, sua cadeira e orações...na dos meus avós maternos, o bolo de Vozinha, o cheiro de Vozinho, os terços, as novenas, as conversas e os risos ecoando no alpendre, as janelas, a rede, o céu do sertão, os vagalumes, as canções dos pássaros e os sons da roça....o cuidado da irmã Lane, as delícias culinárias da Tia Coca, os preparos cuidadosos de tia Toinha e a generosidade e acolhimento de Mãe, me ensinam a ser casa onde meus passos alcançarem.

Proximidade
O entardecer no mar do Nordeste em Aracaju, clicada por minha filha Isa abraçando minha saudade. O amanhecer clicado na estrada de Pernambuco por meu irmão Giva irradiando a luz da nossa irmandade, as fotos dele e meu irmão Paulo na companhia do meu pai em Lagoa do Barro, da igreja, da praça, do Juazeiro, do açude e do sítio de tia Lia...em Parnamirim, os meninos visitando tio Neto, Vozinha e resenhando no churrasco na casa do meu primo Fernando...as gargalhadas chegam pelo vento que sopra amor... imagens que afagaram meu espírito com a proximidade que nos enlaça além-fronteiras.

Embarques
Os próximos embarques estão marcados. Meu caçula Arthur viajará para suas férias no sertão, entre Parnamirim e Araripina, minha rede de apoio para cuidar dele durante minha viagem para o Norte global. A sua mãe aqui cruzará o Atlântico para a missão com a primogênita, acompanhar o nascimento da minha neta, ainda sem nome. A baby menina chegará no Natal e com a bênção de Nossa Senhora sinalizará o renascimento de um novo tempo. Na aurora invernal ela chegará para completar a tríade da minha Bruna. Tem um propósito grandioso na sua maternidade e no laço sagrado que nos une nesse processo de mudanças e cura. Junto comigo estará meu Elo Sagrado, a filha do meio, nossa sensível Isa. Na estrada de saudades que sou, a cada chegada e partida, deixo e trago na bagagem a gratidão das conexões que enternecem minha vida.

Minhas notas de 2024 findam nessa postagem. Os abraços dos netos para aquecer o inverno norte me esperam. As rezas do Sul me seguirão. As saudades permanecerão latejando. Agradeço o afeto da leitura e desejo um Feliz Natal para todos. Até o ano vindouro e que 2025 seja leve. Amém!

sementes, céu, mar, sertão, frontieras, norte, sul, estrada e laços

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