sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Viagem das meninas

Pela primeira vez, aos 50 anos, fiz uma viagem com amigas. Curta e intensa. Com momentos de silêncio, diálogo, contemplação, caminhada, leitura, refeições sem pressas e conexões que seguem ressoando. Uma pausa presente tão transformadora. Um tempo por você e para você. Apreciamos tanto que já estamos planejando a próxima edição. Recebi algumas perguntas sobre a viagem e revendo desde a chegada ao hotel e o retorno pra casa, mergulhei em reflexões que entrelaçam tantas questões, em especial, sobre a importância de nos permitimos pausar e trilhar novos caminhos. Alguns questionamentos revelam o quanto somos sufocadas por pressões externas que tentam nos enclausurar em padrões que, muitas vezes, estão totalmente desalinhados com nossa essência e afetam nossa saúde mental.

Com quem ficou os filhos enquanto você viajava? 
A clássica pergunta que muitas mães ouvem. Resposta: Com o pai. Claro que como mãe não desconectamos total, respondemos as mensagens e ligamos para ver se estão bem. Ah mas será que o pai cuida direito? É dever dele cuidar. E sim eu me preocupo com eles, especialmente com meu caçula, a do meio é bem madura, e estou ciente que a escolha do pai pelas ações facilitadoras como comer fora ou ifood acontecerão. Claro que tem muitas mães solo que não tem o companheiro e fica mais difícil sua jornada. Outros fatores como a idade dos filhos impactam nossas decisões. Tem muitos pais “presentes” e ao mesmo tempo ausentes dentro da própria casa no cotidiano de muitas famílias. A carga maior ainda está com as Mães. A luta por mudança desse cenário é longa e urgente.

Seu marido não acha ruim que você viaja sozinha?
Essa questão tem implícita tanto julgamento e não culpo quem enviou porque é a forma como as relações são desenhadas. Eu devo ser julgada assim: a louca tem coragem de viajar sem o marido e filhos. Bom, meu marido já fez várias viagens sozinho com os amigos. E tudo bem. Da mesma forma que vive se reunindo com sua turma. Então tenho feito esse movimento de me reunir com minhas amigas só as meninas sim. E aqui não é uma competição do tipo você fez e eu vou fazer também. É muito fértil e saudável nos reunirmos assim. Respeitar o espaço de cada um é importante. Tenho amigas que não vão, talvez não se sintam confortáveis ou tem seus outros motivos e tudo bem. Cada uma tem sua narrativa, princípios e etcssssss. Eu sei quem eu sou, o que sinto e faço. Relacionamento é construção de confiança.

Como é a sensação de estar sozinha com as amigas numa viagem?
Maravilhosaaaaaaaaaa! Eu já havia viajado sozinha por outras motivações e para visitar família. Dessa vez foi diferente. A ideia surgiu num dos nossos encontros femininos. E fomos numa tríade. Eu desejo fazer uma viagem solo, só eu, a mochila e o destino para desvendar. Não pude fazer isso no meu aniversário de 50 anos. Está no plano futuro. Então esse convite da viagem das meninas foi um ensaio. Muito bacana sair da sua rotina, conhecer um novo lugar, trocar experiências no trio e com outras pessoas que conhecemos. Esses momentos fortalecem o laço de nossa amizade e nos ensina a força que emana da união feminina. Quantas vezes estamos presas apenas em uma única visão de determinada situação e o olhar da outra nos traz outra leitura? Especialmente quando a intenção é para você despertar e potencializar mudanças que te farão avançar.

Eu compreendo que muitas mulheres não possuem ainda essa possibilidade de viajar sozinha por inúmeros recortes, um deles a violência que nos amedronta. As taxas de feminicídio e outras discriminações e preconceitos são gritantes. "É perigoso demais viajar sozinha." Já ouvi muito e o quanto isso tem a capacidade de nos paralisar! Quebrar essas barreiras é um chamado a nos unirmos cada vez mais. Eu sou muito grata por ter tido a oportunidade de viver esse experimento. Fomos e retornamos seguras e realizadas. Recebi outras perguntas que rendem muitas abordagens. Por hora fico por aqui e desejando que você abra espaço para viver aquilo que palpita em seu coração. O meu está fervilhando de desejos ardentes para seguir escrevendo minha história.


"Eu encontrarei meus pés no caminho" Ouça On The Way Hollow Coves
Foto da fotógrafa amiga Guiomar Leite

sexta-feira, 22 de agosto de 2025

Rota de transição

O amadurecimento amplia nossa percepção do quanto a vida é cíclica. Observar a passagem das estações no meu jardim é uma das formas que pauso para enxergar nesse movimento a passagem do tempo. Os últimos 3 anos foram doloridos em diferentes contextos e, apesar das dores, tenho agradecido pela transformação que esse processo de transição está sacudindo aqui. Um dos desafios é alinhar cada vez mais as escolhas com a minha natureza para priorizar minha saúde integral. Nessa tormenta de flechas incendiarias de todos os lados, mergulhar no silêncio tem sido um bálsamo. Menos é mais e vice e versa.

Enxergar o aprendizado do caminho percorrido, erros e acertos, perdas e vitórias, e sentir-se viva para vislumbrar no horizonte o potencial de fertilizar novas gestações, traz muita esperança. Olhar o passado ressignificando cruzes que latejam, tem me ajudado a cicatrizar pouco a pouco feridas que ainda sangram. Quantas vezes fugimos desse confronto? Lançar luz sobre a escuridão te obriga a encarar de novo, mas agora com outra leitura, sentimentos que carecem de cura. Navegar nesse oceano revolto para chegar a outra margem não é apagar a memória, é um chamado para recomeçar com uma bagagem mais leve. Muitos chamam de deserto e temos que exercitar a resiliência para encontrar o oásis nele e beber da fonte da renovação.

Pausar é uma afrronta em uma sociedade que te cobra a ser competitivo e produzir freneticamente. É preocupante o quanto essa cobrança e necessidade tem adoecido as pessoas. Os números do estresse, burnout e outros distúrbios físicos e psíquicos retratam o saldo dessa lógica do consumo excessivo em diversas linhas. No outro extremo, tenho visto pessoas retomando conexões reais e alterando a rota em busca de um equilíbrio sustentável, algumas depois de passar por situações severas de exaustão e rupturas desencadeadas por relações alimentadas por esse sistema doentio, que tem nos números o maior valor. E o que fazer com as sequelas? Uma motivação para uma nova caminhada acreditando na sua capacidade regenerativa. Você não está sozinho e buscar apoio nessa transição é fundamental.

As experiências marcam. Estar diante da fragilidade e finitude é um convite amargo e doce, uma dualidade que nos faz valorizar o que é eterno na existência. É um valor que não tem medida. É indizível. Demonstrar sua vulnerabilidade também é uma fortaleza. Tem que ser forte. Você é guerreira. Quantas vezes ouvi isso enquanto eu estava dilacerada? Muitas. Precisamos nos permitir sentir e ser. Acredito que é nesse partilhar que vamos nos libertando e sarando. Dizem que nessa fase da menopausa vamos ficando mais chata, eu substituo por seletiva. Claro que os muitos sintomas provocam um turbilhão. No meu caso tenho refinado meu filtro.Por exemplo, vejo muito carisma fake, gente que atua com falsa alegria apenas para vender produtos, serviços ou sua máscara, sendo influencer de mentiras, mascarando violências e entrando nessa bolha de padrões. O afastamento dessa rede faz bem. Aguçar a intuição para focar em relacionamentos que nutrem faz toda diferença.

Transitar no território de mudanças não é tarefa fácil, nos coloca diante de medos e incertezas. Tem uma frase de Clarissa Pinkola Estés que tem ressoado com força: “Ser nós mesmas faz com que nos isolemos de muitos outros e, entretanto, ceder aos desejos dos outros faz com que nos isolemos de nós mesmas.” Praticar essa verdade aflora uma seleção natural e potente. É preciso muita coragem para reconhecer e priorizar você como sua casa e construir diante das possibilidades que tem, a pavimentação de uma nova estrada. Seguir em frente em um novo roteiro abre janelas para aflorar seus próprios recursos, muitas vezes adormecidos pela rotina de demandas externas e desalinhadas com sua essência. Na profundidade habita a luminosidade. E que essa inspiração guie meu novo caminhar:

Dar o coração para uma nova criação, para uma nova vida...é uma descida ao reino dos sentimentos. Pode ser difícil, especialmente se estiver ferido...No entanto, ele existe para ser tocado, para dar vida plena...” Clarissa Pinkola Estés

sexta-feira, 18 de julho de 2025

Giro semanal

Quantas palavras ou cenas definem sua semana? Por aqui tem variedade. E contrariando esse campo raso da Internet, onde alguns apenas observam as manchetes, uns por falta de tempo, e outros porque realmente não tem interesse em enveredar pelas profundidades, eu costumo ainda escrever mais que um parágrafo. Primeiro que calendário ligeiro! O segundo semestre do ano está a galope! Começa a segunda e de repente é sexta.

Domingo 13 cheguei cedo do Rio de Janeiro, exausta da viagem noturna que, mesmo diante do sono, não consigo mais dormir no ônibus. Receio seja sinal da menopausa que bate a porta. Voltei com um rastro de saudades e muita gratidão por ter sido recebida com tanto carinho no Rio de Afeto. O mar, as companhias, as ruas, a feira, os bairros, a igreja e tantos momentos guardados na memória. Prometo encurtar a distância das visitas. Casa, descanso, sono.

Segunda-feira, despertador, acordar, trabalhar, cozinhar, etcs, retornar, casa, jantar, dormir...e dentro desse roteiro um emaranhado de percepções como contemplar o céu da madrugada com as estrelas mais nítidas e a lua brilhando no silêncio da noite. Rezar sentindo o aroma do café que aquece os sentidos, a escrita no caderno de oração, os personagens que palpitam na prece. O dia nasce no caminho e da janela do carro observo a claridade surgir e abraçar a manhã.

Manhãs e noites frias, céu claro, secura na atmosfera poluída, cansaço, rotina, borboleta branca no quintal, ligações, perrengues, correria. Teve a melhor feijoada de Osasco na quarta-feira, visita de mãe na quinta-feira. Conexões com clientes, parceiros e fornecedores e também com comerciantes na avenida dos nossos passos empreendedores. Na agenda, a rotina diferenciada, embora pareça semelhante. Aguçar o olhar te faz enxergar detalhes preciosos.

Fiquei emocionada com a gravação de João Gomes na casa de sua avó. Claro que lembrei de vozinha, vozinho, madrinha, padrinho e toda minha gente que ama. Tenho muito orgulho das minhas raízes que alicerçaram a base de quem eu sou e seguem nos meus passos por onde eu andar. Mostrei ao meu caçula e ele disse, parece terreiro da casa de Vozinha, nascida em Serrita como muitos Netos, nosso sobrenome. Salve a Missa do Vaqueiro!

Li capítulos do livro já deitada em minha cama, piscando entre as linhas. Ler é hábito que amo. E procuro exercitar todos os dias, nem que seja uma página. Pensei agora nos livros que tenho para ler e em outros que quero adquirir. Levei um livro para o RJ e li durante o percurso de São Paulo ao Rio. Que leitura arrebatadora, dessas que te prendem e seguem ecoando. Leiam Estela sem Deus de Jefferson Tenório. Aliás, indico ler e até reler livros e outras publicações para entender melhor sobre diferentes pautas, afinal muitas pessoas abordam apenas o título, que até anuncia parte do tema, mas é bem restrito sobre o conteúdo. Em tempos de IA, que sim é útil para muita coisa, porém emburrece por restringir a pesquisa aprofundada e o pensamento crítico, é preciso refinar a atenção plena para o que realmente importa.

Termino esse giro semanal com esses apelos: leiam e sejam presença real. Faz toda diferença!


Gratidão pela bênção de mais uma semana!

domingo, 25 de maio de 2025

Notas Marianas

O título faz menção ao mês de Maio, de Maria, uma referência a minha devoção de Nossa Senhora, a Mãe do Salvador do mundo. O calendário segue, com alegrias, tristezas, dores, encontros, saudades e esperanças no plural sim, porque eu a invoco para inflamar meus sentidos diante das tribulações. Domingo dia do Terço Glorioso, da glória que veio depois do sofrimento da paixão. Um bálsamo que contagia meu espírito, um sinal fervoroso de que SIM, dias melhores estão no horizonte.

Muitos acontecimentos cabem no mês, semana, dia, noite e até no instante que tem a capacidade de se tornar eterno pelo amor que ele representa. Neste mês das Mães em que homenageamos a Santíssima Virgem Maria, exemplo supremo de amor de Mãe, eu seguro em suas mãos intercessoras e sinto a firmeza de sua proteção. Te agradeço Nossa Senhora de tantos Retratos por me ensinar que no Amor reside a fortaleza divina. Agradeço-te Mãe por me cobrir com seu manto que acalma minha tempestade, ainda que ela esteja feroz.

Refletindo nessa tarde de domingo sobre o mês que caminha para ser encerrado, eu sinto gratidão pelas graças do cotidiano que revelam que a grandeza da simplicidade é uma dádiva. Quantas vezes deixamos de enxergar o valor das pequenas bênçãos? E assim vamos nos afastando da presença de Deus. Quantas pessoas chegou perto de você para falar bem de outra ou te levar uma palavra de afeto? Quantas vieram te falar sobre algum assunto bombástico do momento? Quais livros te indicaram ou podcast sobre assuntos relevantes? Alguém te convidou para uma oração ou você se propôs a ser escuta plena?

Em uma sociedade do cansaço que te cobra dar conta de tudo, observo gente encurralada pela pressa, que sequer observam os detalhes que estão ao seu redor. Correndo para caber em medidas ditadas por padrões, muitos colocam sua atenção em elementos rasos de “receitas” que não combinam com sua verdadeira essência. Muitos leem apenas as chamadas de alguma postagem e já se consideram phd em pautas que não se aprofundam para desenvolver uma leitura crítica. Contagiados pelo excesso de informação, apenas reproduzem sem filtro. Precisamos pausar para ressignificar nossos passos.

Neste 25/05, domingo, eu acordei rezando. A oração tem me aproximado do silêncio. Visitei minha amada mãe, tomei café escutando seu riso, que presença afetuosa. O Cosmos parecido com o Cacau da Bruna e Henrique, estava sorridente em sua companhia. O cachorro que enxerga com os outros sentidos, o companheiro do nosso caçula. No fogão, o almoço colorido e delicioso para a visita que ela convidou, a outra avó paterna dos meus filhos. A generosidade, simplicidade, alegria e ternura de Maria de Fátima, que tenho a honra de chamar de Mãe, são cenas e ensinamentos que nos conectam com a natureza do amor.

Na feira, o pastel, o caldo de cana, o milho, tapioca, alho, hortaliças, legumes, temperos, frutas, cores, falas, risos, aromas e tantos elementos desse espaço coletivo que deixa a rua repleta de bancas e de encontros. Foi a primeira vez que fui à feira esse mês, já estava com saudades, esse lugar tem jeito de Mãe, recordações dos meus irmãos, dos primos e de tantos conhecidos do bairro. As barracas palpitam lembranças, os brinquedos dos filhos e netos, o pastel de gerações entrelaçando memórias. Na minha história de todos os meses que já vivi e dos que, com a graça de Deus, irei viver, memórias afetivas são os tesouros que cultivo.

Ah Maio, mês de um dos momentos mais intensos que seguem tatuados em minha alma, quando eu ainda era menina, no dia 31/05 de outrora, na novena derradeira, obrigada por este maio dos meus 50 anos. A Maria encerra essas notas mensais, agradeço a leitura dessas linhas desconexas, sem edição, apenas letras do coração que lateja saudade.

Com essa publicação, cumpro um dos meus compromissos mensais comigo mesmo, de escrever pelo menos 1 texto, em cada Blog. Escrita com fé e amor.

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Ciclo 50

Chegada dos 50
Uma nova estação em minha vida, o marco do meio século e uma janela que descortina um novo tempo de maturidade. O período que antecede a menopausa, fase de profunda transformação em que as emoções palpitam no mar do desequilíbrio hormonal. Sim os sinais já afloram por aqui, a amora miura já faz parte do meu cotidiano e a busca por orientação qualificada para enfrentar os desafios do novo ciclo. Teve celebração simples no dia 07/03/2025 na companhia das amigas. Teve oração, riso, lágrima e gratidão.

A viagem centenária
Ainda em março, embarquei para Pernambuco, junto com minha Isa, para comemorarmos o centenário da minha avó. Que honra ser neta dessa Fortaleza do Sertão. Sua bênção Vozinha permanecerá em meus passos. O céu sertanejo, de dia e noite, a vegetação, as veredas e as estradas que interligam personagens da minha história. A viagem que restaura minhas forças, alimenta meu espírito e enternece meu coração com fé, afeto, risadas e uma vastidão de amor que recebemos no melhor canto de paz e acolhida. Ouvir sobre a generosidade dos meus avós que salvaram vidas, inundou meu ser de uma gratidão tão leve. Que alegria e que honra ouvir e sentir o abraço agradecido de tantas pessoas. Quanta vida em poucos dias. Memorável.

Chamado e missão
Tenho rezado o Terço, em casa, na caminhada orante e nas casas que abrem suas portas e corações para o encontro mariano. As orações são bálsamos e multiplicam conexões que marcam. As folhas pessoas que viram adubo depois da passagem pelo meu singelo altar, o sopro do vento do outono acendendo a esperança no renascer da ressureição da Páscoa. Desde 2022 iniciei minha caminhada do Terço e cada vez que eu rezo fortaleço a perseverança nesta prece que tantas vezes presenciei na casa das minhas avós. Neste ano do jubileu conheci o rosário do Frei Gilson e como eu aprendi com as passagens bíblicas citadas na fervorosa oração que reuniu tanta gente. Que a presença do Espírito Santo alimente minha força para cumprir esse chamado da Mãe Santíssima.

Tribulação e constância
Temos provações, dificuldades e batalhas, muitas deles, travadas no silêncio. Tenho a graça de acompanhar e aprender com as relações com a família e amigos e com os testemunhos de pessoas conhecidas e até desconhecidas, o quanto a FÉ nos salva e ensina a valorizar o que realmente importa. Nas últimas semanas tenho me visto, menina pequena que sempre fui...sentada do lado esquerdo em um dos bancos próximo a porta da igreja de minha infância, e sentido as lágrimas que aqueciam minha face quando eu rezava a Ave Maria na hora do Terço de Maio, mês de Maria, das Mães. Uma visão que tem palpitado desde que comecei rezar este rosário na quaresma. Um sinal de que sim, mesmo diante das adversidades eu devo manter minha fé firme no filho de Maria, nosso Salvador.

Enxergar vai além
A visão é um dos sentidos preciosos e, ainda assim, há quem olha e não vê. Quantas vezes estamos adormecidos ou entorpecidos com a correria e não observamos com atenção plena os sinais que estão ao nosso redor. Num mundo ávido pela atenção consumo, escolher pausar para enxergar a beleza da simplicidade dos detalhes é contradizer o status vigente e há uma onda que muitos dizem pequena, mas com uma proporção rara crescente, surfando pelo oceano dessa conexão que transforma. A folha que te escolhe na caminhada, a flor que brota no jardim, o canto do pássaro, o encanto das fases lunares, o vento que canta, a risada de sua mãe, a música que acaricia sua alma, a borboleta que baila nos passos na hora que você reza por sua filha e tantas cenas que têm me aproximado cada vez mais da esperança, da fé e do amor.

Que mesmo diante da dor que fere eu continue cultivando o amor que liberta e cura. Amém!

sábado, 15 de fevereiro de 2025

Dia memorável

Sexta-feira, verão, manhã, caminhada orante, passos, folhas personagens, pássaros cantando, beija-flor, suor, banho, café e saída de casa. Escola, na companhia do Elo Sagrado, andamos, pausa para deixar mochila, cachorro-quente no calçadão, estação Osasco, bilhete, trem. Destino Ipiranga para mais uma consulta na especialidade gratidão. Linha 8 Diamante, próximo a passagem entre os vagões, no balanço do meio que Arthur adora surfar, ela está encostada lendo seu kindle. Um casal ao meu lado fala em espanhol ligeiro, toca o telefone dele e inicia uma conversa operária com quem está do outro lado da linha, negociações nos trilhos. O trem é também comunhão de línguas, lugares e personagens.

Barra Funda, escadas e na plataforma logo embarcamos na linha 10-Turquesa. Descemos na Ipiranga, atravessamos o canteiro, a linha férrea, passamos pela comunidade, roupas no varal em frente as casas miúdas, rádio tocando, vozes misturadas, passos apressados, embaixo do viaduto o vai e vem das pessoas, atravessamos a rua e chegamos na parada dos motoboys em frente ao Mooca Plaza Shopping. Muitos ali esperando o chamado Ifood para sair com as entregas, disputando a pouca sombra da calçada. 34 graus marca a temperatura e o céu anuncia o temporal. Entramos no palácio das compras pela entrada dos boys delivery em frente a praça de alimentação. Almocei com o coração latejando. Perguntei ao segurança sobre a saída para pedir Uber e depois da parada para comprar o chocolate preferido da Isa que acontece nessas ocasiões médicas, nos sentamos no confortável e assombreado banco a espera do Uber. Pensei que os motoboys do outro lado, poderiam ter um desses também.

Trovões e nuvens anunciam a chegada do temporal e eu rezei para chegarmos antes dele desabar. Os pingos na janela, o Museu e o parque do Ipiranga e mais adiante o centro clínico. Desço e me deparo com a lixeira que dá o recado. Já no endereço familiar, com a chuva torrencial caindo lá fora, aguardamos o chamado da Doutora Thaís que nos recebeu com seu sorriso. A gratidão a essa especialista é contínua e o tratamento seguirá com novo retornos e, com a graça de Deus, avanços. Ainda chovia, de forma moderada, quando descemos do primeiro andar para iniciar o trajeto do retorno. Uma senhora passando mal, o socorro das enfermeiras, a aflição da acompanhante. Ao nosso lado um casal, a senhora dizendo ao marido que não voltaria com ele de moto, eles sofreram um acidente que a traumatizou e os pinos são lembretes doloridos. Ela me perguntou sobre estação metrô e trem por perto, eu expliquei e avisei que estava indo, ela disse que ia procurar ônibus para ir até lá e eu respondi que não precisava, que ela iria conosco. Não tenho dinheiro, retrucou. Não precisa eu já paguei o Uber e a senhora pode ir conosco.

Na corrida, ela nos conta detalhes sobre o infarto do marido, motorista do articulado do Campo Limpo-Bandeira, aposentado e que ainda trabalha porque precisa, de como homem doente dá trabalho e eu concordei e até o motorista do Uber entrou na roda, do filho que morreu com 48 anos há 2 meses sozinho em casa no bairro de Pinheiros com um pico de diabete e que só 2 dias depois encontraram seu corpo, da dor da perda...ela também irradiou alegria ao falar da construção de sua casa própria perto de Poá, que está fazendo um pouquinho por vez, que também é Pernambucana, vai fazer 70 anos em abril, tem 13 netos, ainda faz faxina e uns bicos...chegamos na Juventus-Mooca, antiga estação férrea. Dois rapazes que certamente voltavam do seu turno de trabalho, nos ajudaram a chegar na plataforma certa. A Dona Lourdes me falou da pamonha que “faz como ninguém”...entramos no trem, na próxima estação, Brás, ela desceu, nos despedimos no vagão e a gratidão no seu olhar fará morada eterna em minha alma...vou seguir sonhando com o sabor da pamonha...

Ainda na Turquesa, segurando perto da saída, uma nova conversa de duas mulheres jovens partilhando com sorriso a aridez de aperreios: “em casa só tenho 2 xícaras, 3 pratos, 1 cadeira e 2 copos. Nem posso receber ninguém” e gargalharam em sintonia. “No começo é assim mesmo e eu só tenho o que uso nem posso te ajudar, mas vou ver o que separo.” Elas pareciam ser companheiras de empresa ou bairro, dividindo cenas da vida na ida e volta da linha férrea. Um nó na garganta e a o aviso da nossa estação. Descemos na Barra Funda, elas e os demais seguiram. A estação do meu Palmeiras, meu time e eu senti saudades dos dias dos jogos que fui junto com meus irmãos. Sobe, desce escada, plataforma lotada de pessoas, uma filha consola a mãe que chora abraçada em seu ombro, ou seria amiga? Eu choro por dentro e ouço as maravilhas da química e da evolução tecnológica desse século que a Isa me ensina. Os ambulantes vendendo água, cerveja gelada, kit manicure pronto para uso: “já está amolado e esterilizado, só 20 Reais.” Depois de Altino saímos espremidas em Osasco. Estava abafado, tínhamos sede e cansaço. Água, café e partida. Isa foi encontrar o pai e irmão, eu segui para minha consulta.

Na Avenida Santo Antônio, o padroeiro de Osasco que está sem catedral. A construção da nova em pleno vapor. Enquanto aguardo minha vez, reencontro com conhecidos das antigas. Dessas surpresas preciosas que nutrem a teia do tempo. Da consulta para o café amizade. É incrível a grandeza do diálogo com quem temos refinamento de alma. Noite, calçada, céu, abraço e despedida. Entro no quinto Uber do dia. Destino casa. Sou surpreendida de uma maneira que não há palavras para descrever. O que eu ouvi e senti no intervalo de quase 20 minutos seguirá ecoando. Como alguém que talvez eu nunca mais encontre foi capaz de transmitir uma mensagem tão tocante? Que resposta! Deus envia sinais e anjos. É nessa trilha de AMOR que eu encontro sentido em todas as estações e com os personagens que eu cruzar.

Que dia Memorável! Gratidão Deus!

quinta-feira, 9 de janeiro de 2025

Distância e proximidade

Estar perto e longe ao mesmo tempo é possível? Em certo sentido sim. As vezes tem pessoas que está ao seu lado e distante milhares de milhas. Outras que estão fisicamente em outro continente e muito mais próxima naquilo que importa. Estou há 32 dias longe do Brasil, na missão mãe e avó, nesta viagem invernal e tenho refletido muito sobre esses extremos. Me perguntaram do que sinto mais falta nessa experiência da viagem mais comprida que já fiz. Talvez eu não consiga descrever todas as coisas porque a saudade vai aflorando nos detalhes do cotidiano. O canto do pássaro na árvore seca desperta lembrança, o formato de uma nuvem, o cheiro do alho fritando no azeite, o riso das crianças e tantas cenas daqui que entrelaçam recordações de lá.

Contemplando um painel que Peaches fez das suas férias no Brasil do ano passado, lembrei dos meus contando sobre a hora de compartilhar na aula sobre as férias, logo após o início de cada semestre, seja na escrita, fotos ou oralidade. Tenho escrito poucas linhas diárias sobre minha passagem por aqui e fiquei pensando o quanto de vida esses dias estão acrescentando a minha memória afetiva. Na gélida estação do Norte, o calor do afeto tem aquecido minha alma. Eu sou grata por estar aqui, ainda que seja tão doloroso a saudade de todos que verdadeiramente me amam e que estão do outro lado do Atlântico. Sou mulher do sentir e sei bem quem são.

No começo da viagem, tivemos por aqui a companhia da Isa, a tia amada de Peaches, Damian e Alise. Meu caçula Arthur viajou para Pernambuco. Os dois já estão em casa desde final de dezembro. E minha maravilhosa irmã tem me ajudado muito. Alise, a menina luz, nasceu dia 13/12/24, na Lua Crescente, dia de Santa Luzia. Foi a primeira vez que eu pude acompanhar esse momento tão precioso da minha primogênita que completou sua tríade. Sintonia refinada com a mãe aqui. Eu acredito em propósito divino e sinto com toda força que a maternidade da Bruna tem um sentido tão intenso que ela vai descobrindo e vivenciado em cada ciclo. Quando sentimos no ventre e assim que nasce acolhemos em nossos braços o bebê, um turbilhão de sensações percorre nosso ser. Eu jamais vou conseguir descrever tamanha imensidão.

Uma vez ouvi: você é uma avó jovem. Nem tanto assim. Este ano completarei 50 anos e segurando Alise no colo me pus a rezar para que eu possa ter a graça de viver muito mais para continuar visitando-os aqui e os recebendo no Brasil, nesse ir e vir de chegadas e partidas, nesse espaço de vida que vamos colecionando memórias. Voltando as perguntas, para findar o texto, deixo aqui minhas simples observações sobre essas questões cujas respostas podem ser bem diferentes para cada pessoa e até ter semelhantes em alguns pontos com as minhas também.

Do que sinto mais falta nesse período longe de casa? São muitas, do abraço a comida e tantas variáveis que renderiam páginas e páginas, mas vou me deter em três que representam muitas para findar esse texto: 1- dos filhos: do aperto abraço do meu Arthur, meu caçula que tira meu juízo e inunda minha vida de amor e das falas da Isa, da sua sensibilidade que me abraça no olhar. 2 - do café da minha mãe nas manhãs de domingo. Somos muito abençoados por ter essa Maria de Fátima e tia Lane e Coca...). 3 - dos laços amizades e das conversas presenciais profundas e recheadas de riso.

Sobre a minha pergunta - estar perto e longe ao mesmo tempo é possível? - deixo aqui outras perguntas provocações para que questionem: você está realmente presente em cada ação? Tem atenção plena na escuta do outro? Está atento a fala durante a conversa ou absorto em distrações? Quantas vezes você esteve com alguém do seu lado e se sentiu sozinha? E como é encantador quanto sentimos o contrário. Quando a pessoa está distante léguas e te conhece tanto que sente pelo som da sua voz como você está. Isso sim faz diferença. Que sejamos cada vez mais Presença real. 

Viagem das meninas

Pela primeira vez, aos 50 anos, fiz uma viagem com amigas. Curta e intensa. Com momentos de silêncio, diálogo, contemplação, caminhada, leit...