O clima
Meu corpo anda dolorido da avalanche de demandas e cá estou para registrar minhas notas nessa manhã quente da primavera paulista.Começo refletindo sobre como a meteorologia
impacta o estado dos sentidos. Na semana úmida de novembro, quando a umidade aflora o cheiro do
mofo das coisas, o céu cinza, ausência do sol, despertou memórias do passado,
passos com pés molhados pelo furo e rosto quente de lágrimas salgadas. Um contraste
da garoa fina e incessante com o rio quente que descia dos olhos, aquecendo a
caminhada. Lembrei também da umidade da serra em Ubatuba com as frestas de sol
que surgiam de quando em quando e acendiam a esperança do céu azular. Qual o meu clima agora?
Agarrando-me a brecha solar que indica que a estrela está viva.
A cirurgia
Na companhia de mãe, nas estações Osasco, Barra Funda e Bresser Mooca,
catracas, exames, consultas, cardiologista, cirurgião, pressão baixa e alta no círculo
das emoções. Observando seus cachos com a tiara de pano que ela adotou, seu olhar
preocupado, sua angústia desse ir e vir, incomum a sua rotina. Começamos mãe, temos
que ir avançando nas etapas e finalizar o processo, dizia eu buscando uma coragem que em alguns momentos vacilava também. E chegou o dia da cirurgia.
Ainda era madrugada quando saímos de casa para o hospital. Meu coração suspenso
ao afagar seu braço quando ela foi com a enfermeira para o centro cirúrgico. As
horas intermináveis até eu novamente encontrar com minha mãe no final do dia
arrastaram-se doloridas. Ela se recupera bem, em casa, seu canto favorito.
Ser casa
Minhas referências de lar, quando eu realmente me sinto em casa, tem
personagens vivos, em carne e osso, e nas recordações que palpitam no meu
corpo. A casa dos meus avós paternos sempre tinha gente, filhos, netos,
sobrinhos, parentes de diferentes graus e conhecidos. O doce de madrinha, sim
ela foi e segue minha madrinha-avó, as merendas que vinha da bodega, seu pirão,
sua cadeira e orações...na dos meus avós maternos, o bolo de Vozinha, o cheiro
de Vozinho, os terços, as novenas, as conversas e os risos ecoando no alpendre,
as janelas, a rede, o céu do sertão, os vagalumes, as canções dos pássaros e os
sons da roça....o cuidado da irmã Lane, as delícias culinárias da Tia Coca, os
preparos cuidadosos de tia Toinha e a generosidade e acolhimento de Mãe, me ensinam a ser casa onde
meus passos alcançarem.
Proximidade
O entardecer no mar do Nordeste em Aracaju, clicada por minha filha Isa abraçando
minha saudade. O amanhecer clicado na estrada de Pernambuco por meu irmão Giva
irradiando a luz da nossa irmandade, as fotos dele e meu irmão Paulo na
companhia do meu pai em Lagoa do Barro, da igreja, da praça, do Juazeiro, do
açude e do sítio de tia Lia...em Parnamirim, os meninos visitando tio Neto, Vozinha
e resenhando no churrasco na casa do meu primo Fernando...as gargalhadas chegam
pelo vento que sopra amor... imagens que afagaram meu espírito com a proximidade
que nos enlaça além-fronteiras.
Embarques
Os próximos embarques estão marcados. Meu caçula Arthur viajará para suas
férias no sertão, entre Parnamirim e Araripina, minha rede de apoio para cuidar
dele durante minha viagem para o Norte global. A sua mãe aqui cruzará o
Atlântico para a missão com a primogênita, acompanhar o nascimento da minha
neta, ainda sem nome. A baby menina chegará no Natal e com a bênção de Nossa
Senhora sinalizará o renascimento de um novo tempo. Na aurora invernal ela
chegará para completar a tríade da minha Bruna. Tem um propósito grandioso na
sua maternidade e no laço sagrado que nos une nesse processo de mudanças e
cura. Junto comigo estará meu Elo Sagrado, a filha do meio, nossa sensível Isa.
Na estrada de saudades que sou, a cada chegada e partida, deixo e trago na
bagagem a gratidão das conexões que enternecem minha vida.
Minhas notas de 2024 findam nessa postagem. Os abraços dos
netos para aquecer o inverno norte me esperam. As rezas do Sul me seguirão. As
saudades permanecerão latejando. Agradeço o afeto da leitura e desejo um Feliz
Natal para todos. Até o ano vindouro e que 2025 seja leve. Amém!